Teste de língua para ítalo-descendentes a partir da terceira geração? “Chegamos ao limite da inconstitucionalidade”, diz Fabio Porta

Ao comentar projetos que tramitam em comissões do Parlamento sobre alterações na lei da cidadania italiana, o ex-deputado Fabio Porta teceu sérias críticas à atual representação parlamentar do Brasil e, também, ao senador Ricardo Merlo, subsecretário para os italianos no mundo da Farnesina, que recentemente admitiu a possibilidade da instituição de um exame de língua italiana a partir da terceira geração como condicionante à transmissão da cidadania por direito de sangue.

“Eu não sou jurista – disse Fabio Porta em tele-entrevista à revista Insieme -, mas sei que quando se faz uma coisa deste tipo, chegamos ao limite da inconstitucionalidade. Ou alguém é italiano ou não é. Se existe um teste, deve funcionar para todos. Se existe um critério, deve valer para todos”. Em vez de “barreiras” e “discriminações”, Porta defende incentivos e “mais recursos para os cursos de língua italiana”.

O conteúdo integral da entrevista que será publicado na próxima edição da revista (setembro) gira em torno dos projetos de Elisa Siragusa (M5S), que pretende limitar a transmissão da cidadania ‘iure sanguinis’ na primeira geração no exterior, e Laura Boldrini (grupo PD), que retoma o debate sobre a introdução do ‘ius soli’ modificado, também chamado de ‘ius culturae’, a filhos menores de imigrantes residentes na Itália.

“A cada um ou dois anos, no final de uma legislatura, vêm aqueles que pensam ser o momento para modificar a lei da cidadania”, argumenta o ex-parlamentar, ao indicar os motivos pelos quais o debate não deve prosperar. A proposta de Siragusa é “equivocada e ridícula”, mas o mais sério, para Porta, foram as recentes declarações de Ricardo Merlo que, ao comentar o projeto da parlamentar do M5S, mesmo defendendo a manutenção do ‘ius sanguinis’, admitiu a possibilidade de um teste de língua à maneira do “Decreto Salvini” (que instituiu a exigência para o caso da cidadania por casamento).

“O ‘Decreto Salvini’ é a causa das grandes dificuldades e da discriminação que está acontecendo com milhares de brasileiros que estão indo na Itália para apresentar pedido de cidadania no ‘comune’”, argumenta Porta. “Hoje, em muitas situações, o ítalo-brasileiro é considerado da mesma maneira que o estrangeiro que não tem direito à cidadania italiana”.

“Quero deixar claro que essa vontade de limitar o ‘ius sanguinis’ existe em todos os partidos. Incluindo os partidos que mais deveriam defender os italianos no exterior”, disse Porta em outro trecho da entrevista: “Isso não está sendo de esquerda, de direita, nem de centro. Por quê? A ignorância, infelizmente, existe em todos os italianos, em todos os partidos, em boa parte da opinião pública. E o nosso papel é exatamente aquele de mostrar com argumentos, claramente, que este caminho não é um caminho inteligente e produtivo para a Itália; mostrar que milhões de italianos fora da Itália constituem uma oportunidade que hoje temos que valorizar, e não eliminar”.

Porta voltou a defender, entretanto, o projeto de Boldrini. “Não é momento de criar barreiras” mas de “ajudar a integração”, disse ele, garantindo que não há no projeto a intenção de alterar o princípio do ‘ius sanguinis’. “Acho incompreensível, acho estranho – aduziu – que um italiano que vive no exterior – que justamente é filho, neto ou bisneto de pessoas que chegaram nesses países e que foram acolhidos e integrados justamente por lei de cidadania que aceitou a integração -, de repente, de uma forma pouco sensata, combata essa possibilidade para outros migrantes que, hoje, como nós fizemos há cem anos, estão buscando uma oportunidade em nosso país”.

O ex-parlamentar que hoje responde pela coordenação do PD – Partido Democrático em toda a América do Sul foi instado a falar também sobre o “obstrucionismo consular” na questão das filas da cidadania. Um dos problemas: há pouco tempo, o ex-cônsul Nicola Occhipinti anunciava o fim da fila no Rio Grande do Sul até o ano em curso; agora os tempos de espera voltaram aos doze anos. “O que está acontecendo em Porto Alegre, é muito grave”, disse ele, pois, além de tudo, representa “até uma grave perda de recursos para o Estado italiano” que deixa de receber os “famosos 300 euros do fundo da cidadania”.

Cuidar disso, segundo Porta, seria papel do Comites local e, principalmente, dos atuais parlamentares eleitos na América do Sul, mas “nesse momento, infelizmente, estamos com uma carência e precisamos de representantes menos folclóricos e silenciosos e mais sérios e atuantes”. Sem citá-lo nominalmente, Porta criticou as “palavras ofensivas” dirigidas a Siragusa pelo deputado ítalo-brasileiro Luis Roberto Lorenzato.

Na “máquina da Farnesina”, por outro lado, estaria a responsabilidade principal pela “falta de diplomatas” competentes, referindo-se a casos como o dos cônsules de Curitiba e de Porto Alegre. Ao Brasil, “às vezes são enviadas pessoas que não têm comprometimento nem conhecimento e visão com relação à comunidade ítalo-brasileira” e este – segundo Porta, “é um problema de quem está em Roma. Ou seja, da máquina da Farnesina, dos políticos que estão no comando do Ministério das Relações Exteriores”.

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